domingo, 23 de agosto de 2009

Amélia de Oliveira



Transcrevo abaixo uma das postagens do Blog Literatura em Vida 2, da escritora Eliane F.C. Lima, blog que é um dos meus favoritos. Criado recentemente, o blog é um mar de Literatura abrindo-se para ser navegado por todos que amam a arte literária.
Leiam a manifestação machista de Olavo Bilac e conheçam a bela poesia de Amélia de Oliveira.


“LITERATURA DE ONTEM 2
Vamos conviver aqui com Amélia de Oliveira, poetisa. Como infelizmente, na época, século XIX, escritoras tinham sempre sua identidade estabelecida pelo elemento masculino - hoje muita gente boa já pesquisa sobre elas -, a escritora, como tantas outras, passou para a história literária como a irmã do poeta parnasiano Alberto de Oliveira ou a noiva frustrada de Olavo Bilac, costume ainda hoje presente até na Internet, onde é citada, quase que exclusivamente, nos sites sobre ambos. Recomendo para pesquisa:

1. Antônio Miranda, Poesia dos Brasis, onde aparecem inúmeras escritoras.
2. A resenha de Lilia Moritz Schwarcz para o livro Escritoras esquecidas pela república no endereço http://www.topbooks.com.br/frMateria_ESP_070805.htm
3. O Dicionário crítico de escritoras brasileiras, de Nelly Novaes Coelho, pelo menos, na versão online.

Sobre várias outras escritoras igualmente anuladas, indico o trabalho de equipe de um grupo de pesquisadoras que resultou no livro Escritoras brasileiras do século XIX, organização de Zahidé Lupinacci Muzart, Editora Mulheres.

O reforço explicativo dessa invisibilidade fica clara no trecho de uma das cartas de Bilac para a então noiva, abaixo transcrito.

Carta
Olavo Bilac

(...)
Já te disse que há mais de dois meses tinha eu vontade de te escrever em liberdade, para coisa urgente. Trata-se disto:
Não me agradou ver um soneto teu no Almanaque da "Gazeta de Notícias" deste ano. Não foi o fato de vir em um almanaque o soneto que me desagradou: desagradou-me a sua publicação. Previ logo que andava naquilo o dedo do Bernardo ou do Alberto. Tu, criteriosa como és, não o farias por tua própria vontade. Folguei muito, depois, vendo a minha previsão confirmada por D. Adelaide. Devo confessar que fui o primeiro a insistir contigo para que publicasses versos. Cheguei mesmo a dar alguns aqui, no "Mercantil". Fiz mal. Arrependi-me. Hás de concordar comigo.
Há uma frase de Ramalho Ortigão, que é uma das maiores verdades que tenho lido: - O primeiro dever de uma mulher honesta é não ser conhecida. - Não é uma grande verdade? Reflete sobre isto: Há em Portugal e Brasil cem ou mais mulheres que escrevem. Não há nenhuma delas de quem não se fale mal, com ou sem razão. Além disso, quem publica alguma coisa fica sujeito a discussão, cai no domínio da crítica. E imagina que mágoa a minha, que desespero meu, se algum dia um miserável qualquer ousasse discutir o teu nome! Eu, que chego a ter ciúme do chão que pisas, eu que desejava ser a única pessoa que te pudesse ver e amar, - ouvir discutido o teu nome. Ainda há bem pouco tempo, em S. Paulo, um padre, escrevendo sobre Júlia Lopes, insultou-a publicamente. Eu nada tinha com isso. Mas tratava-se de uma senhora e mulher de um amigo meu: tive vontade de esmurrar o padre. E sem razão. Sem razão, porque uma senhora, desde que se faz escritora, tem de se sujeitar ao juízo de todos. Não quer isto dizer que não faças versos. Pelo contrário. Quero que os faças, muitos, para os teus irmãos, para as tuas amigas, e principalmente para mim, - mas nunca para o público, porque o público envenena e mancha tudo o que lhe cai sob os olhos.
(...)

Teu noivo,
Olavo Bilac
(cerca de 1888)

Inacreditável para o mundo de hoje. Aí está a explicação para que um sem números de mulheres que deram seus textos a público tenham desaparecido do cenário. Se você ficou revoltada(o) como eu, vingue-se agora e leia o belíssimo poema de Amélia.

SONETO
Amélia de Oliveira

Não te peço a ventura desejada,
Nem os sonhos que outrora tu me deste,
Nem a santa alegria que puseste
Nessa doce esperança, já passada.

O futuro de amor que prometeste
Não te peço! Minha alma angustiada
Já te não pede, do impossível, nada,
Já te não lembra aquilo que esqueceste!

Nesta mágoa sorvida, ocultamente,
Nesta saudade atroz que me deixaste,
Neste pranto, que choro ainda por ti,

Nada te peço! Nada! Tão-somente
Peço-te agora a paz que me roubaste,
Peço-te agora a vida que perdi!

(ELTON, Elmo. Amélia de Oliveira - 1868-1945. Rio de Janeiro: Edição do autor, 1977)”

2 comentários:

Sandra Lúcia Ceccon Perazzo disse...

Meu Deus, que absurdo!
É mesmo inacreditável que um homem culto como Olavo Bilac, fosse tão machista e tão preconceituoso.
Por mais que a época em que viveu isso fosse fato, não esperava isso dele.
Mais uma que aprendi aqui, Marise.
Belo soneto de Amélia, belo demais para ele. Não consegui me sentir vingada...rsrsrsss... ainda estou perplexa.
Beijos carinhosos
Sanzinha

Patricia disse...

Sou descendente dela, fiquei muito emocionada, até chorei...ela era tia da minha avó.
Gostaria muito que vc entrasse em contato comigo, meu e-mail patymetzger@hotmail.com