domingo, 22 de março de 2009

Fernando Pessoa




Abdicação

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho. Eu sou um rei
Que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.

Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mãos viris e calmas entreguei;
E meu cetro e coroa — eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços

Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.

Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia.

Fernando Pessoa
(In Cancioneiro)

Um comentário:

Sandra Lúcia ceccon Perazzo disse...

Esse me mata, acaba comigo!
Como pode ter existido esse homem com tantos e inúmeros corações.
Acredito que para a maioria das pessoas Fernando Pessoa é o poeta preferido, mas para mim ele é muito mais que isso. E só para você fazer idéia, não sei descrever o que sinto, só posso mesmo sentir... e é tanto e muito que sinto, que evito ler seus poemas...vai entender!!!