terça-feira, 6 de março de 2012

João Guimarães Rosa



Sono das Águas

Há uma hora certa,
no meio de noite, uma hora morta,
em que a água dorme. Todas as águas dormem:
no rio, na lagoa,
no açude, no brejão, nos olhos d’água,
nos grotões fundos.
E quem ficar acordado,
na barranca, a noite inteira,
há de ouvir a cachoeira
parar a queda e o choro,
que a água foi dormir…

Águas claras, barrentas, sonolentas,
todas vão cochilar.
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas,
fios brancos, torrentes.
O orvalho sonha
nas placas de folhagem.
E adormece
até a água fervida,
nos copos de cabeceira dos agonizantes…

Mas nem todos dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono…

(In Magma)

Um comentário:

Anônimo disse...

Guimarães Rosa conseguiu imaginar o que estou imaginando...
aqui nesse verso:

" Mas nem todos dormem, nessa hora
de torpor líquido e inocente.
Muitos hão de estar vigiando,
e chorando, a noite toda,
porque a água dos olhos
nunca tem sono…"

Belo e me tocou a alma !
Marise querida , estou encantada com sua Atualização , Tudo aqui é lindo , primoroso , sem palavras!
Parabéns querida! Seu espaço literário é o melhor que conheço em toda Internet. Beijos , Agradeço pela sua presença em minha caminhada . Você é uma pessoa muito especial !
Vera