terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Martha Medeiros



Amigos leitores e seguidores do Scenarium, volto a me dedicar a este espaço, depois de um período de descanso.
Agradeço a todos que aqui estiveram apenas nos visitando ou deixando seus comentários. Aproveitei para consertar alguns links que haviam se agrupado, e caso algo mais for encontrado fora dos trilhos será ajeitado na medida do possível.
Deixo com vocês uma bela crônica da Martha Medeiros, que a mim diz muito, muito mesmo!


A nova minoria

É um grupo formado por poucos integrantes. Acredito que hoje estejam até em menor número do que a comunidade indígena, que se tornou minoria por força da dizimação de suas tribos. A minoria a que me refiro também está sendo exterminada do planeta, e pouca gente tem se dado conta. Me refiro aos sensatos.
A comunidade dos sensatos nunca se organizou formalmente. Seus antepassados acasalaram-se com insensatos, e geraram filhos e netos e bisnetos mistos, o que poderia ser considerada uma bem-vinda diversidade cultural, mas não resultou em grande coisa. Os seres mistos seguiram procriando com outros insensatos, até que a insensatez passou a ser o gene dominante da raça. Restaram poucos sensatos puros.
Reconhecê-los não é difícil. Eles costumam ser objetivos em suas conversas, dizendo claramente o que pensam e baseando seus argumentos no raro e desprestigiado bom senso. Analisam as situações por mais de um ângulo antes de se posicionarem. Tomam decisões justas, mesmo que para isso tenham que ferir suscetibilidades. Não se comovem com os exageros e delírios de seus pares, preferindo manter-se do lado da razão. Serão pessoas frias? É o que dizem deles, mas ninguém imagina como sofrem intimamente por não serem compreendidos.
O sensato age de forma óbvia. Ele conhece o caminho mais curto para fazer as coisas acontecerem, mas as coisas só acontecem quando há um empenho conjunto. Sozinho ele não pode fazer nada contra a avassaladora reação dos que, diferentemente dele, dedicam suas vidas a complicar tudo. Para muita gente, a simplicidade é sempre suspeita, vá entender.
O sensato obedece regras ancestrais, como, por exemplo, dar valor ao que é emocional e desprezar o que é mesquinho. Ele não ocupa o tempo dos outros com fofocas maldosas e de origem incerta. Ele não concorda com muita coisa que lê e ouve por aí, mas nem por isso exercita o espírito de porco agredindo pessoas que não conhece. Se é impelido a se manifestar, defende sua posição com ideias, sem precisar usar o recurso da violência.
O sensato privilegia tudo o que possui conteúdo, pois está de acordo com a máxima que diz que a vida é muito curta para ser pequena. Sendo assim, ele faz valer o seu tempo. Não tem paciência para os que são regidos pela vaidade e não dizem nada que preste. Constrange-se de testemunhar o vazio da banalidade sendo passado de geração para geração.
Ouvi de um sensato, dia desses: “Perdi minha turma. Eu convivia com pessoas criativas, que falavam a minha língua, que prezavam a liberdade, pessoas antenadas que não perdiam tempo com mediocridades. A gente se dispersou.” Ele parecia um índio.
Mesmo com poucas chances de sobrevivência, que se morra em combate. Sensatos, resistam.

Revista O Globo – 31/01/10

3 comentários:

Eliane F.C.Lima disse...

Marise,
Folgo em vê-la - não seria melhor lê-la? - de volta. A crônica da Martha está ótima, como todos as outras dela. Que bom que os sensatos ainda podem se reunir em torno de um texto, pelo menos!
Abração,
Eliane F.C.Lima

Sandra Lúcia Ceccon Perazzo disse...

Minha amiga, vi tudo que postou até aqui, apenas não fiz comenário para cada um, como gosto de fazer.
Sempre tudo muito lindo. Amei os poemas de Natal, tão bem selecionados por você.
Li o seu e-mail dizendo que também está voltando. Fico feliz que tenha tirado essas férias.
Beijos com saudades e carinho
Sanzinha

Sandra Lúcia Ceccon Perazzo disse...

O que dizer diante deste texto?
Só posso aplaudir com admiração.
Excelente escolha Marise querida.
Beijos
Sanzinha